segunda-feira, 25 de maio de 2009

a idade dos porquês é agora


Aiiiiiiiiiiiiiiiii.
Não consigo entender, que coisa é esta?
Porque é que viver é isto?
este nada com desgraça à mistura
almas vazias, vazias e sós.
porque é que enfeitaram tudo?
para que são as àrvores, as flores,
o mar, o céu azul, as estrelas?
Afinal desde sempre nos tentaram incutir a ideia de que a vida é bela.
Balelas.
Para já não sabemos o que é o belo.
O que é o belo?
As aulas de filosofia nunca responderam.
Ou então usaram a mesma resposta de sempre: é subjectivo.
Tudo é subjectivo,
Ou não fôssemos nós, almas vazias, vazias e sós,
Perdidas na subjectividade de uma individualidade
Pela qual lutamos diariamente sem nos apercebermos de que foi conquistada à nascença.
Porque nascemos?
O que estamos aqui a fazer?
Também não sabemos.
Alguém me explique então, qual foi a ideia de juntar num planeta tantas almas vazias e sós.
Juntas mas sós.
A solidão na esfera da união.
O que é a solidão?
É isto?
Mas o que é isto?
Sou eu?
Ser?

(o que é?)

Não consigo entender. Será que parar de questionar ajuda a entender alguma coisa? Ou será que toda a gente decidiu viver na ignorância? Serei eu a ignorante?
Acho que já vivi muita coisa e no entanto não me sinto viva. Terei vivido demais? Esgotou-se-me a vida e eu nem reparei? Não, surreal. Mas afinal o que é real? A dor. A dor é sempre real. Os motivos da dor, podem ser todos psicológicos. Mas a dor em si é real. Primeiro o choro, depois a revolta, a inércia, finalmente o isolamento, talvez a loucura. O ciclo vicioso da dor. E o tempo passa. E a dor instala-se, não está só de passagem. Demora-se em cada fase. Quanto tempo? Porque é que nunca sabemos quando é que vamos ter coragem para deixarmos de ter medo e arriscarmo-nos a ser felizes? Demora o tempo que precisamos para mudar. Porque é que somos todos tão fracos? E egoístas? De onde é que vem o egoísmo, afinal? Porque é que não foi erradicado ao longo dos anos? Os anos?
O que é o tempo?
Repito, o que é o tempo?
Aiiiiiiiiiii. É o mesmo do que perguntar o que é o amor.
O que é o amor?
E eu sorrio porque acho na minha inocência de corpo sem alma que pelo menos isso conheci. Vivi. Senti. Deixei que se apoderasse de mim. Deixei que me satisfizesse e depois que me destruísse. Assim. E depois perdi. Não só o amor. Tudo.
O que é o tudo?
O nada não pode existir, acho eu.
Ou será não pode não existir?
O que interessa é que até aquilo que não é nada é algo. O nada pesa. Tira forças. E não deixa nada. Ou então deixa tudo em forma de nada. Deixa por exemplo o amor sob forma de dor.
Porque é que a droga existe? Para provar que o mundo real (ou aquele em que vivemos) não é bonito. Pelo menos lembro-me de ter aprendido isto com ela.
Porque é que a arte existe? Para provar que a vida não é suficiente.
A vida não é suficiente?
Então quais são os limites?
Porque não mos mostram?
Porque é que tenho que ser eu a explorá-los?
E porque é que decidi não recorrer à arte para fazê-lo?
Porquê?
Porque é que eu não tenho quatro anos,
E ainda estou na idade dos porquês?






domingo, 24 de maio de 2009

"The end comes when we no longer talk with ourselves. It is the end of genuine thinking and the beginning of final loneliness."

Não consigo pensar,
Não consigo sentir,
Não consigo estar só
Mais um dia.
Vejo, observo, absorvo
Mas o quê?
Nada muda,
Tudo destrói.
E eu continuo aqui
Sem pensar
Sem sentir
Só comigo
Que já nem sou.

sábado, 16 de maio de 2009

this is not a love song

Fica comigo,
Podemos fazer de conta que
A dor foi embora
E perder-nos
No calor do nosso abraço
Que não serve
Para aquecer
Os nossos corações,
Tantas foram as horas frias
Passadas na ausência
Do amor.

Fica comigo,
Vamos saltar por entre
Trampolins de ternura
E fazer malabarismos
De afecto. De afecto!
De mãos dadas,
Faremos o pino,
Voaremos até
Onde as nossas
Liberdades nos deixarem
E nunca perderemos
De vista o caminho
Para nossas casas.

Fica comigo,
Eu só quero sentir, partilhar.
Não quero amar,
Porque amor para dar
Sinto que não tenho.
Deixaram-me sem nada
Ou então deixei eu
Que me levassem tudo.
Mas o pouco que tenho
É a ti que quero mostrar.
Foste tu quem apareceu,
Foste tu quem reparou
No vazio e na dor
Que aqui moravam.

Fica comigo,
Posso não ser aquilo
Que queres.
Mas sei que precisas
De mim, ou pelo menos,
De alguém.
E eu sou alguém
Que te quer bem.
(Não sei se sabes que)
A minha vida
Ganhou um novo sentido
Com a tua chegada.
E às vezes penso
Que se tiveres que partir
Prefiro que seja já.
(E no entanto,
não consigo evitar pedir,)
Fica comigo.
Porque as horas
Não custam a passar
Quando estás aqui.
O meu sorriso,
Afinal existe.
E os teus olhos.
Os teus olhos,
Pousados em mim
São um beijo
De boa noite
Que tu não sentes
Mas me dás.

Fica comigo,
Mesmo que saibas
Que não sou uma
Pessoa feliz.
Eu estou bem,
Contigo.
Eu estou bem,
Comigo.
Só preciso
Que me deixes
Entrar nesse
Teu mundo.
Afinal duvido
Que seja muito
Diferente
Do meu.
Fica comigo,
Ou pelo menos
Deixa-me tentar
Ficar contigo.
O medo é muito
E sabemos que
O amor é dor.
Mas eu só quero
Olhares de boa noite
Sorrisos de companhia
Abraços de reconforto.
És a única pessoa
Que me dá isso.
Por isso não partas,
Fica comigo.





terça-feira, 28 de abril de 2009

28.04


Lembro-me deste dia, há cinco anos atrás. Cinco anos. Às vezes parece-me uma eternidade, outras vezes a memória encurta a distância do passado. Pouco importa, há cinco anos eu não era isto. Tu não eras isso. Mas o mundo era este, nós é que achávamos que não. De nós os três acho que ele é o único que vai mais ou menos seguindo o mesmo caminho, mesmo que saiba que nunca irá chegar a lado algum.
Que é feito de ti? Não sei. Se queres que te diga, perdi a vontade de saber. Não há lugar nem motivo para seres algo em mim. Se te dissesse isto olhos nos olhos, sei que te irias rir. Porque sabes perfeitamente que te eternizaste em mim e que haverá sempre um espaço para ti, um tempo para te recordar, pelo meio das muitas horas vazias que vou percorrendo no meu caminho, que hoje é tão diferente do teu. E então? Se soubesses como estão vivas na minha memória tantas outras situações, que não me provocam o mal que tu me fizeste... Posso sempre recorrer a elas em vez de pensar em ti. A escolha é minha, sempre foi. E eu escolhi-te a ti, há cinco anos. E voltei a escolher-te, todos os dias da minha vida, a seguir a esse, no início porque a tua presença na minha vida me proporcionava um bem-estar que nunca antes eu tinha atingido, depois porque a dor provocada pela tua ausência, pelo teu desaparecimento, foi durante muito tempo a única coisa a que me pude (ou quis) agarrar para te reviver, para nos reviver.
Não sinto nenhum rancor, ódio ou raiva por ti. Demorou tempo, é certo. Sei que foi contigo que aprendi o amor e foste tu também quem me ensinou que posso acolher dentro de mim todo o tipo de sentimentos. Do melhor ao pior. Hoje guardo apenas os bons, porque me cansei de ser infeliz num mundo irreal. Se é para ser infeliz, que seja neste mundo onde as coisas existem, onde as pessoas se falam e os sentimentos são de agora. Porque ficar no passado para se ser infeliz, é o mesmo do que nos visualizarmos num futuro feliz. Recordar e idealizar, tudo acaba por ser irreal. Gostava de conseguir banir da minha vida estes dois conceitos, mas acho que deixaria de existir caso tal acontecesse.
Pela primeira vez na minha vida, estou a tentar viver no presente. Ao descobrir a amizade, depois de ti, fiquei a saber que existem outras formas de amar. Que nos fazem menos mal e que nos podem preencher igualmente se assim o quisermos. Mas infelizmente eu faço parte daquelas pessoas que querem sempre mais, que nunca estão satisfeitas com o que possuem, talvez consequência de uma idealização excessiva, da busca de uma perfeição que tenho consciência de não existir. Mas isso sempre fez parte de mim. O que muda, não muito frequentemente, porque gosto de ficar presa a uma ideia durante muito tempo, é o objecto da minha idealização. E neste momento, posso dizer que sinto a mudança invandir-me. Sinto que já não és tu, já não é o nosso nós que eu idealizo. Sinto-me Dalí, sem que tu o sejas. Sê Picasso, sê o que quiseres. Sê feliz, ri, ama, chora, cresce, sente, dá a volta ao mundo. Sê tudo o que não pudeste ser comigo, que eu também não vou deixar fugir a oportunidade de poder ser algo sem ti. Ser algo melhor sem ti. Sozinha ou de mão dada com alguém, alguém que não sejas tu.


terça-feira, 10 de março de 2009

(à bout de souffle)


Hoje nem sequer vou escrever. Isto não são palavras, são sentimentos ou qualquer coisa que vem de mim. Não é beleza, é sinceridade, sou eu a gritar por toda a parte. É a raiva que eu deito fora todos os dias porque não gosto de viver com ela, porque prefiro a tristeza e a melancolia e a depressão. Porque será sempre melhor ser-se depressivo e inerte e neutro fechado no seu mundo, do que ser-se estúpido ou maldoso ou agressivo para os outros. É a única justificação que eu arranjo para aquilo que eu sou. Talvez seja isso, talvez seja a fuga a uma coisa que me impede de libertar-me de outra. Não quero nem saber, eu não estou a pensar, eu nem estou a ler as frases para ver se fazem sentido. NADA faz sentido. Ou então tudo tem o mesmo sentido, o do abismo. O do fim. O da loucura. Há alturas em que só estas palavras me dizem alguma coisa. Que se fodam os outros, hoje. Não quero saber se os magoei, se não fui correcta, se alguma vez na vida senti o que foi ser egoísta. Estou-me completamente a cagar para aquilo que provoquei nos outros. Porque eles não fazem nem ideia daquilo que eu já passei por eles, tudo para não lhes ter raiva ou ódio ou desejá-los mortos. É que já é algo automático que faz parte de mim, se por acaso sinto por um efémero segundo alguma dessas coisas, logo de seguida, PAM! estala a depressão ao seu mais alto nível e a culpa e a dor e o ódio a mim mesma por tais pensamentos me terem ocupado a mente. Mas qual mente? Quais pensamentos? Isto são emoções, se eu pensasse não pensaria em nada disso. Ai meu deus, até já chamo por ti que sei que não existes. Se odeio alguém por mais que um segundo deves ser tu, porque sei que não existes e no entanto és culpado de tanta coisa neste mundo, que incrivelmente, tem gente que te ama mais a ti do que aos amigos ou à família. Como?? Como é que num mundo em que tal situação é possível pode existir alguma coerência? É por isso que nada faz sentido. A culpa é tua. Não é só tua, mas também é tua.
Apetece-me dar murros às pessoas às vezes. Nunca o faço. Então porque é que dou murros às paredes e a mim mesma, porque é que me drogo quando sei que me estou a destruir e quem eu quero destruir não sou eu, mas sim quem me levou a mim à destruição? Mesmo que seja por um segundo, sim. Apetece-me injectar cada uma dessas pessoas com este novelo de sentimentos de merda com que elas me deixaram. Para que os possam sentir, pelo menos uma vez. Para que me possam sentir pela última vez, mesmo que não queiram. É que deviam, não sabem a intensidade que estão a perder. Eu é que já não preciso de me drogar para partir em bad trip. Sorte ou azar, não sei. Mas tudo voa no mesmo sentido.
Hoje mando toda a gente à merda. Podia morrer, que ninguém se apercebia. Neste momento ninguém ousaria sequer pôr a hipótese. Ninguém sentiria a dor que vai misturada com esta raiva e este ódio a não sei bem quem por causa de não sei bem o quê. MAS A DOR PELO MENOS É REAL. E eu também, ao que parece. Qual parte de mim, não sei, pouco importa, são demasiadas partes para analisá-las todas e é por isso que estou a dar em doida.
Mas sei que se morresse, amanhã todos chorariam. Todos. Todos aqueles que neste momento se estão a cagar para o que me atravessa a cabeça. Da mesma maneira que eu amo (repito, AMO - porque felizmente? sei o que isso é) todas as pessoas por quem sinto ódio ou raiva durante um segundo perdido no meio do tempo. O problema é o tempo, merda para o tempo, que morram as horas e os minutos de desespero, os segundos de ódio e de raiva.

Normalmente choro, hoje escrevo. Não é escrever, tal como não tem sido chorar. Tento libertar-me mas cada vez mais me prendo àquilo que me faz mal. Àquilo que me enloquece.

Dão chuva para amanhã. Respiro fundo, mentalizo-me de que vai chover amanhã e pronto. Talvez no próximo ataque de raiva que me der, me dê para mandar a chuva à merda e tudo esteja na consequência deste suspiro de agora. Hoje foram as pessoas que não sei bem quem são nem o que me fizeram. Mas são e fizeram-no, disso estou certa. Porque eu também já fui e também já fiz e é por isso que hoje vivo assim.

E se ousarem perdoar-me, pouco importa, porque eu nunca me perdoo a mim mesma.

segunda-feira, 2 de março de 2009


17.02.2009 - Les Jours Tristes

"Pediste-me algo e não me sinto capaz de fazê-lo. Há muito que tem sido assim, deixei de conseguir servir os outros de tão fechada que estou em mim. É desnecessário voltar a repetir-me, estou tão cansada que me ocorram os mesmos pensamentos. Há pouco vi um filme e um personagem disse "What we feel, what we think, isn't important. It's utterly unimportant. The only question is what we do." Já me devo ter deparado com esta frase ou outras que pretendem passar a mesma mensagem centenas de vezes. Mas acho que nunca tinha pensado sobre isso. Parece paradoxal pensar sobre isso, não é? Hoje pensei, acabei por nem prestar atenção ao resto do filme.
Sinto que estou parada. O tempo deixou de o ser, o que me envolve é o acumular de dia após dia sem que hajam metas, acontecimentos. Durante uns dias aconteceram coisas, durante uns dias a minha vida não fui só eu. Já me tinha esquecido da sensação de companhia que as pessoas podem proporcionar umas às outras. E eu sei que tudo esteve longe de ser perfeito. A agressividade, a falta de paciência, até de tolerância, foram fruto da ausência tão prolongada de pessoas, de relações. Tu apercebeste-te e eu senti-o: eu mudei, e não foram só as expressões ou os gestos. Mas afinal não estamos todos constantemente a mudar? Até quando a nossa vida parece estar parada.
Mas tenho medo da minha mudança. Acho que todos sabemos que metade daquilo que somos é influência dos outros. Neste momento não há ninguém na minha vida que me influencie. Já não ganho tiques dos outros, já não rio de forma parecida a ninguém, acabou-se o uso de expressões que alguém de vez em quando inventava ou mandava para o ar. Eu acho que tu deves ser a pessoa que está mais perto de ter noção da dimensão da minha solidão. Como te disse, já aprendi a não reparar em coisas engraçadas ou bonitas na rua, porque não há uma única pessoa a quem eu possa contar no fim do dia o que vi de tão interessante.
Às vezes acho que estou sozinha porque fiz mal a todas as boas pessoas que apareceram na minha vida, de uma maneira ou de outra. Será que te fiz mal a ti também? Questiono-me sobre isso muitas vezes. Tu não eras assim quando nos conhecemos. Tu trataste de mim quando eu estive mal, quando mais ninguém tinha tempo ou disponibilidade para ir visitar-me nas minhas noites de (pseudo?) solidão durante a semana, nas Caldas, tu aparecias. O que aconteceu contigo? Fui eu? Diz-me a verdade. Por outro lado, não quero saber que fui eu se não puder fazer nada para remediar o que fiz. E não posso. É como se alguém tivesse agarrado na minha vida, em cada momento, em cada pessoa, em cada factor importante, e a tivesse mandado numa caixa para outro planeta, inacessível, perdido numa galáxia qualquer à qual não posso chegar. E o que me deixaram a mim? Deixaram-me comigo, não podiam ter-me feito pior, não podiam ter decidido pior sentença para os meus pecados. Há muito que também deixei de acreditar que a justiça existe.
Se soubesses como eu gostava de ajudar-te. Mas há coisas que não percebo. Vou pedir-te que leias Ricardo Reis porque a escrita e a filosofia dele fazem-me lembrar o teu comportamento comigo. Não entendo essa tua fuga a momentos felizes, se soubesses como tenho sede deles, como anseio por vivências que me preencham, por pessoas que me façam companhia por si próprias, sem que sejamos confrontados com a necessidade de acrescentar pós mágicos às nossas horas de partilha. Disso estou eu cansada. Acho que no fundo tudo acaba por ser paradoxal. O tempo parou, a minha vida não anda, não há momentos nem horas nem pessoas, não acontece nada, eu não faço nada, eu não sou nada. E no entanto, estou tão cansada de ser isto.
Quando a minha casa ganha vida, eu quero desfrutar porque sei que em breve tudo voltará a ser silêncio. Acreditas que só tinha feito sol três vezes este ano até há duas semanas atrás? E de repente, houve uma mistura de tudo. Neve, chuva, dias cinzentos, mas também sol, dias de céu completamente azul, outros com umas nuvens a enfeitar... E ontem, tu viste. Hoje olho para a janela e tenho um déjà vu de ontem. E de até há duas semanas atrás. Será que foi de propósito? Será que fui eu que alucinei durante estes dias e vi sol a mais?
Sabemos que os dias seguintes, estes dias em que estamos, que temos, que ainda nos faltam, custam sempre. E é por isso que temos que controlar-nos durante o tempo em que estamos juntos? Para mim não faz sentido. Mas respeito a forma como vives as coisas, eu também sou tão full of shit e a minha forma de lidar com as coisas é capaz de ser ainda pior que a tua...
Tu tens pessoas, por poucas que sejam. Agarra-te a elas, enquanto as tens. Eu agarro-me aos meus pais, porque descobri que não tenho mais ninguém e que eles não vão durar eternamente. Tal como todas as outras pessoas da nossa vida. Só que os pais temos sempre tendência a deixar de lado. É estranho que hoje eles sejam tudo o que eu tenho.
Cuida de ti. E não te deixes levar, a culpa não é tua, não é de ninguém. A vida é assim. Pode ser que consigamos endireitar as nossas vidas mesmo que o mundo não faça o mesmo consigo próprio e, em consequência, connosco. Tu sabes que bem ou mal, eu continuo aqui. Não me peças é beleza em dias tristes que eu não consigo dar-te isso. Mas sei que vais continuar à espera e espero um dia ser capaz disso e muito mais."


Acho que não publiquei isto na altura porque tinha esperança de que passasse rápido. No entanto passaram-se duas semanas e os meus dias nada mais me têm oferecido que a mesma mistura de tristeza e vazio, a substância que há tantos meses reage comigo. Quando me perguntas como estou, apetece-me ralhar-te, apetece-me pedir-te para que não o faças mais, porque tu já sabes a resposta. E sabes que no dia em que for feliz vou gritá-lo a toda a gente, se só te ofereço silêncio por agora é porque esse dia ainda não chegou. E para além disso não gosto que me perguntes como estou, porque não importa. Não há nada que possas fazer por mim, tal como não há nada que eu possa fazer por ti agora. Só gostava que nos nossos próximos dias felizes, naqueles que certamente vão anteceder outros dias tristes como estes têm sido, te esqueças do que vem a seguir ou do que veio antes. É que em seis meses, eu só consegui sentir-me viva quatro vezes.

Mas em seis meses descobri uma coisa importante. Eles não brincam quando dizem que a solidão mata. E quem não a conhece, nunca soube, nunca saberá, o que significa ser. Porque quando não temos ninguém, não somos nada. E apercebemo-nos finalmente daquilo que é ser, porque não o somos.

Quando estou contigo, quando estive com eles, quando estou com alguém que não eu ou os estranhos que passam por mim na rua, eu sou alguma coisa. O mundo vale alguma coisa. Não me tires isso, da próxima vez que eu te puder abraçar.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

little miss sunshine

Quando era pequena tinha uma preferência por rapazes louros. Imaginava o meu futuro, futuro esse repleto de riqueza, fama e reconhecimento. Seria escritora ou cantora ou arquitecta, tanto fazia. Estava certa de que um dia seria reconhecida pelo meu talento, pela minha diferença, pela minha sabedoria que era tanta considerando a idade que eu tinha. Eu achava que sabia tudo e quando aprendia novas coisas, não estava realmente a adquirir novos conhecimentos, para mim era apenas a constatação daquilo que já me era inato. "A Tatiana? Nunca precisei de dizer-lhe para estudar, é ela própria que se fecha no quarto durante horas, debruçada na cama por entre livros e não só os da escola". Estas eram as palavras da minha mãe perante estranhos que pouco se importavam com aquilo que eu era ou fazia. Eu sei que mesmo a minha mãe não ligava. Só queria fazer boa figura diante dos outros, sempre foi algo que fez parte dela.
Eu achava que um dia iria aparecer na televisão. Atrás de mim uma paisagem seca e árida, a pobreza extrema, povos pouco inteligentes sem preocupações metafísicas, a dor nessa altura era para mim sinónimo de morte ou falta de saúde. Haveria de ter uma casa. Não, uma casa não. Uma mansão. Sim, daquelas com court de ténis e piscina e cavalos e sala de jogos. Porque eu haveria de ser a melhor jogadora de ténis de entre os meus amigos, passaria horas a dar braçadas dentro de água, daria passeios pela minha propriedade no meu cavalo que se chamaria Étoile, seria aquela que enfiaria a bola preta num dos seis buracos da mesa de snooker, para finalizar um jogo exemplar, todos os fins de semana, a casa a abarrotar de gente. Seria também aquela que iria oferecer uma casa à beira mar, batida pelo sol a maior parte do ano, aos meus maravilhosos e distantes pais. Sabia que os faria felizes e finalmente iria ser reconhecida por eles.
O amor? O amor iria aprendê-lo no meio dessas povoações pobres, que não se preocupassem com dinheiro ou reputação ou prestígio. Eles iriam ser a fuga ao meu dia-a-dia dominado por uma agenda que me obrigaria a encontrar gente rica e famosa e interessante(?). Um dia, numa viagem aos países nórdicos, à Austrália ou talvez à minha cidade natal, encontraria um rapaz louro, abastado e de boas famílias, que não se importasse de me acompanhar nas minhas excursões aos outros países de terra seca e árida, onde a neve e a chuva fariam falta, mas onde a neve e a chuva deixariam de ser importantes, ao lado de simples batatas ou de um tecto.

Quando descobri o amor pela primeira (e única?) vez, bem longe de terras secas e áridas e de pessoas pobres cuja maior preocupação seriam batatas ou arroz ou uma mosca que teimasse em infectar e matar pessoas, percebi que o rapaz louro, a mansão, a fama e o prestígio não significavam nada. O meu maior talento era agora proporcionar felicidade. O meu reconhecimento, ser feliz e amada em troca. Não que o amor seja uma troca, mas sim uma partilha. Afinal não se trocam ideais com ninguém, para quê trocar mansões imaginárias com alguém quando se podem partilhar sorrisos, palavras ou silêncios? Para quê um rapaz louro? Porque razão dar aos meus pais uma casa à beira-mar se lhes posso simplesmente mostrar que sou feliz, que consegui. Nunca ousei mostrar-lhes, as circunstâncias fizeram com que eles conhecessem um pouco da minha felicidade que se reflectiu em tristeza e angústia irremediáveis para eles. Para eles não. Para ela. Para ele, apenas indiferença.
O que esperavam de mim? O rapaz louro, a mansão, a fama? Porquê? Será que ter filhos não passa da esperança de conceber alguém que seja capaz daquilo que não ousámos fazer, daquilo que receámos ou abandonámos por sermos fracos ou porque a vida nos impediu de atingir?

Oh maman, se tu vivesses a vida a preto e branco como eu. Há dias em que só a dor aparece para me fazer companhia e tudo o que é cor deixa de o ser para dar lugar ao preto. Há outros em que nada tem cor, em que a paz se mostra presente para que eu possa sossegar e dar folga à escuridão que me assombra durante horas, dias, já não sei que valor poderá ter um relógio, um calendário. Eu sei que há uma altura da vida em que o que é ideal deixa de o ser. Nós mudamos, a vida muda connosco, ou somos nós que mudamos em consequência do preto e do branco e das outras cores com que ela nos pinta. Ou que nós nos pintamos, pouco importa. Talvez importe mas eu já não consigo distinguir aquilo que nós fazemos daquilo que a vida nos leva a fazer. Às vezes gosto de pensar que a culpa não é nossa, afinal "C'est pas nous qui marchons pas droit, c'est le monde qui va de travers".
Uma vez li que as nossas ambições estão directamente ligadas com as esperanças que os nossos pais depositam em nós. Se assim for, peço-te apenas que me idealizes como um ser feliz. Há muito que o meu ideal deixou de ser o rapaz louro, a mansão, a reputação. Eu só quero viver em paz, numa harmonia pintada de dias brancos misturados com cor, quero que sejas feliz por eu ser aquilo que pretendes que eu seja, que eu pretendo ser, a oportunidade, a simplicidade de seres feliz em consequência da felicidade de alguém, é essa a prenda que eu quero dar-te.
E quero que saibas que se um dias tiveres netos, não serei eu a concebê-los. Tenho medo, tanto medo, de cometer os mesmos erros que tu cometeste.

Ajuda-me a chegar ao arco-íris da felicidade. Ao sítio onde o sol brilha, não todos os dias, mas durante a maior parte do ano, sem que seja numa vivenda à beira-mar, na companhia de alguém que seja reconhecido por ser poderoso. O poder do teu sorriso reflectindo a minha chegada a esse lugar será tão mais grandioso. Não queiras para mim aquilo que tu não foste, que não pudeste ser e que eu nunca serei. Afinal não sou melhor que tu. Por que razão haveria eu de alcançar tudo aquilo que passou por ti e não agarraste? Eu sei que faço parte desse lugar brilhante, onde por momentos, te deixas ficar e que te permite esquecer que tudo o resto não tem cor. Tu também fazes parte desse meu lugar, só que teimas em não deixar-me lá chegar. Deixa de idealizar, ou idealiza apenas felicidade para mim, seja ela de que cor for. É que se não o fizeres só estarás a juntar obstáculos ao meu caminho e a única coisa que quero é chegar lá com a tua ajuda, não com as dificuldades que me espetas pela frente.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

obsequium parit amicos, veritas parit odium

Deixei de me olhar ao espelho. Irrita-me que ele só me mostre, mas não me explique. Gostava que na parte inferior da minha imagem, aparecessem umas legendas de vez em quando. Sentimentos, pensamentos, recalcamentos, tudo deveria estar escrito para que não fosse preciso penetrar mais na minha cabeça para descobrir o que se passa afinal. É que se eu soubesse, jamais partilharia incertezas, falsidades. Aliás, nunca fui muito de partilhar essas coisas, sempre fui mais de não partilhar nada, mas no fundo não partilhar também provoca o incerto, acaba por ser falso. Como é que uma coisa que não o é, pode ser algo? De nada me serve a tolerância, de nada me serve a compaixão, de nada me serve a bondade. Elas deixam de existir, a partir do momento em que eu não sei ser.
Verdade, verdade, porque foges de mim? Serei eu que receio encontrar-te? Eu achava que de ti não tinha medo, só da realidade. Afinal quem sou eu? Afinal o que são os outros? O que somos nós?
Por agora, vazio.

sábado, 10 de janeiro de 2009

fantômes

- Chega aqui.
Chamas-me tantas vezes. Ligas-me, vens buscar-me, encontras-te comigo, levas-me no carro, agora também já eu te levo a ti. Onde vamos? Onde tu quiseres ir, eu vou onde tu fores (afinal não vim para onde vieste?). Provavelmente é contigo que passo mais tempo. E pensar que vivi uma vida sem ti. Gritos, mágoa, dias e noites, anos de desespero. Como pude provocar-te tudo isso, se nada mais fiz senão espalhar o meu amor, aquele que afinal deves ter sido tu a ensinar-me? Tu provocas muito mais em mim. No dia em que partires, partirei contigo. Morta já estou, só não morro agora porque não conseguiria provocar-te mais tristeza que aquela que já existe em ti.


- Sempre passas logo à noite no bar?
De cada vez que o faço, não me apetece falar nem discutir (nunca acontece) nem sequer olhar-te. Apetece-me não ter que recuar no tempo nem ter que usar a memória para me sentir nos teus braços outra vez. O teu colo. Aviões de felicidade e inocência que percorriam manhãs numa cama de casal à qual não pertencia eu, mas na qual deve ter ocorrido o primeiro momento da minha existência. Gostava de um dia adormecer no teu peito, só mais uma vez. Homem da minha vida.

- Não me deixes sozinho.
Não voltarei a fazê-lo. Solidão, solidão. Se este mundo fosse outro agarrava em ti e fugia contigo, para que jamais te sentisses sozinho. Partiríamos os dois, rindo-nos da solidão. Não sei se deixaria a minha vida por ti. Mas deixaria tudo por aquilo que construímos e nos foi tirado, pelo tempo, pela idade, por sei lá. Perdi a conta às alcunhas, às lutas na porta do meu quarto, ao futebol com uma bola de ténis no corredor da casa (temos que parar, são sete horas e a mãe deve estar a chegar! ah, parti a jarra, e agora? não te preocupes, eu digo que fui eu). Sempre me protegeste, parece que chegou a minha vez. Nem que seja uma forma de me proteger a mim mesma: Prometo nunca mais te deixar.

- Vamos fumar?
Vamos, pois. Antes pensava em ti e surgia-me a imagem do verão. Dos muitos verões, em que te via chegar depois de quase infinitos meses de espera. Sempre fomos a sósia interior uma da outra e a melhor dupla da família a jogar snooker. Acho que foi o verão que nos tornou especiais. Agora que se acabaram os verões não sei o que nos torna especiais. Presumo que te questiones sobre o mesmo, mas não vale a pena. Vamos fumar que o fumo resolve, pelo menos devolve-nos o sorriso e achamo-nos especiais, mesmo que a sensação dure apenas uma noite de verão. Afinal a vida não passa de um jogo de snooker: é só jogar às nossas bolas, sem tocar nas dos outros. Nós bem que o fazemos, mas de vez em quando lá caímos no erro de enfiar a bola preta. E logo aparecem os adversários para nos derrotar. Não desistas, uma partida tem mais que um jogo.

- O que é que queres?
Não te quero a ti. Já não. Mas o meu inconsciente noite sim, noite não, faz questão de te querer. Negação. Mas porque é que eu haveria de te querer agora? Depois de toda a dor que se instalou em mim, sim, provocada por ti, qual seria a felicidade que me poderias trazer? Alguma, mais que esta que tenho agora, responde uma qualquer parte de mim, que se eu soubesse onde se esconde, socava-a até à morte. Meu deus, porque é que eu quis amar? E porque é que te amei e tu me amaste, e agora não te amo nem tu me amas, e eu continuo mergulhada neste mar, de não sei bem o quê, certamente família da loucura. A loucura. Foste tu quem ma ofereceu. Que quero eu? Que não a vejas, que não a tomes, porque devolver presentes é falta de educação. Foi por isso que te deixei em paz, não por mereceres que eu respeite o teu silêncio, pois devíamos gritar-nos mesmo em vão, um dia, tudo aquilo que não soubemos dizer quando foi preciso.

- Volta para nós.
Como poderia eu voltar ao lugar onde os traumas nasceram, cresceram e se apoderaram de mim? Nunca. É um nunca a gritar a tristeza, a pena e a culpa que residem em mim. Não que queira a distância, muito menos o tempo. As vozes, os olhares, o toque, o toque das mãos tão diferentes umas das outras, os risos que a certa altura se começaram a misturar de cumplicidade, o conforto de um peito liso ou de outro volumoso. Anseio-vos a toda a hora. Mas jamais viveremos aquilo que vivemos. É uma questão de habituação, como tudo na vida. Trago-vos todos os dias comigo, converso convosco à beira do lago para não conversar comigo mesma, esquecendo por momentos que sou a única voz que se ouve. Gosto de pensar que por vezes são as vossas que me aconselham. Que me dizem o que fazer a seguir. E não esta confusão de cérebro que já não sei se está vivo. Vocês? Estarão sempre vivos dentro de mim.

- Desaparece.
Acho que nunca ninguém mo disse. Até nas piores rupturas, zangas, discussões, gritarias e depressões, não me recordo de ter ouvido tal palavra. A verdade é até, que quando esses fins chegam, não são anunciados como fins. Esperança que morre logo de seguida, quando me dou conta do desaparecimento. Afinal ninguém mo diz, limitam-se a fazê-lo, sem me avisar, como se assim custasse menos. Não custa menos nem mais. Custa. Dói quando me apercebo, dói um bocadinho mais no mês ou ano seguinte quando tenho a certeza, até que a dor se incrusta e não mais desaparece de mim. Quando quiserem fugir, não desapareçam, sem nada dizer. Prefiro ser eu a fazê-lo, prefiro sabê-lo no dia em que o fim nos aparece, prefiro não ter que viver com a incerteza, a angústia, a culpa, a esperança que morreu, a dor, a dor, a dor.


Esquecer-vos, esquecer tudo o que se passou, esquecer a dor, o amor, a felicidade (por mais que efémera, por vezes contínua, em raros círculos nunca repetitivos) é pôr fim à minha existência.
Já vos perdoei, quero perdoar-me. Tento perdoar-me, a cada instante, cada vez mais. Preciso de vocês, preciso de não lembrar, preciso de viver, preciso de vos viver.

Estou a caminho. Ajudem-me, dêem-me as coordenadas.




terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Margarida


Eu sei que tu sabes que não há palavras nem telefonemas que possam substituir a minha presença. Mas também sei que a vida não pode corresponder sempre aos nossos sonhos e vontades. E por isso hoje vou ficar-me pelas palavras e por um telefonema mais daqui a pouco.
Poderia ter-te enviado uma carta, certamente que ficarias contente. Junto à carta poderia enviar-te também, um presente. Não o fiz. Achei que mais do que coisas materiais, precisava de te oferecer um espaço só teu neste sítio só meu, porque afinal vou acumulando aqui tudo o que é importante (e até coisas que não o são) e, para ti, que tens importância suficiente para te imortalizares até em mim, quanto mais neste lugar, nunca tinha escrito nada.

Antes de mais, parabéns. Primeiro, porque é hoje que se comemora a tua existência. Não que tenhas algum mérito em ter nascido, mas é importante que estejas neste mundo. Mas mais importante que isso, é que estejas na minha vida. Quando penso em ti, já não penso no que passou. Já não penso em todos os momentos que vivi contigo. Penso no que está para vir. E nos momentos que ainda nos esperam. O mundo espera-nos. Sabemos tão bem disso, nós. Pelo menos eu sinto que o que quer que o mundo ainda me esteja a reservar como surpresas, sei que vão ser coisas que partilharei contigo (não importa se for através de palavras escritas ou de um telefonema, penso eu). Sei que é impossível prevêr o futuro e que amanhã qualquer uma de nós poderá estar morta. Mas quero acreditar que ainda temos muitos longos anos pela frente e que por piores que sejam as circunstâncias, por mais graves que sejam os nossos erros, quero acreditar que continuaremos a ser aquilo que temos sido. Não como pessoas. Como pessoas, sei que podemos melhorar muito. Mas no que toca à nossa relação, sabes que não peço mais de ti. Sinto que te estabilizaste em mim, mesmo se agora desaparecesses e eu nunca mais te visse, iria continuar a levar-te comigo para onde quer que fosse. Tal como fiz quando vim para aqui.

Quero dizer-te que eu sei quem tu és. E sei daquilo que és capaz. Não quero que desistas como eu fiz. Não quero que te aches incapaz de concretizar os teus sonhos só porque há dias em que as coisas não correm como as planeaste. Haverão sempre dias desses. E nesses dias tens que te concentrar em ti. Não podes pensar nas pessoas que estás a desiludir. Não podes pensar que está tudo perdido. Não podes pensar que não haverão dias melhores, porque garanto-te que haverão. E será nesses dias melhores que aquilo que de melhor há em ti aparecerá também. E o mundo estará aqui para te aplaudir, tal como esteve nos dias maus para te crucificar. Só quero que saibas que eu estou aqui em todos os dias da tua vida, aplaudindo a tua existência e a tua presença na minha vida, porque a mim isso basta-me. O que tu és chega-me, não preciso que faças nada.
Mas o mundo é cruel e bem mais exigente que eu. Aposto que toda a gente já deixou escapar a expressão "amor incondicional", mas muita dessa gente não faz ideia do que isso significa. Nós sabemos, e pelo menos eu, pretendo dar-te provas deste meu amor incondicional por ti nos muitos longos anos que ainda nos esperam. Dar-te uma prova não significa que vou centralizar todo o meu amor por ti num momento qualquer das nossas vidas. É bem mais que isso. É garantir que viverás cada dia da tua vida com a certeza de que te amo e que estou aqui, sempre.

A tua construção babybelica (inventei uma palavra!!) está em cima da bancada da cozinha. Todos os dias quando acordo e bebo o meu café, contemplo-a. E depois, sorrio. Por vezes, é o único sorriso que se me esboça na cara durante um dia inteiro. Mas é um sorriso tão sincero, tão nosso, tão eterno. Porque por detrás da construção babybelica estamos nós. Está uma história. E está um futuro.

Até já, meu amor.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

you know the day destroys the night

"With insomnia, nothing is real. Everything is far away. Everything is a copy of a copy of a copy."

E eu sei que os desassossegos das noites são causados pela vacuidade dos dias.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

les rendez-vous au bord du Léman

Uma vez por semana, mais vez menos vez, lá estamos nós. Costumamos encontrar-nos na ponte e seguimos pela margem direita do lago até chegarmos ao sítio, que cada vez mais, se torna nosso.
De todas as vezes destes últimos três meses, esta foi aquela em que percebi que afinal valia a pena nos sentarmos naquele alinhamento de rochas e observarmos durante horas o quadro que a paisagem vista desta cidade parece ser.
Tu começaste e não demorou muito até que eu me juntasse a ti. Não nos tocámos, nem falámos. Durante largos minutos, apenas chorámos. Não sei se a minha primeira lágrima se soltou por te ver chorar a meu lado, mas sei que deixei cair as seguintes, uma por uma, até que se esgotassem. Porque senti que podia ficar ali horas a chorar contigo, sem que nada dissessemos um ao outro. Soube-me bem chorar, ao contrário das últimas vezes, e sei que foi por o teu choro lá estar a reconfortar o meu.
Não havia ninguém por perto, hoje. Mas a certa altura aproximaram-se uns patos, pretos e magros (a mim pareceram-me magros, não sei qual é o peso médio de um pato), como se quisessem apreciar de perto a nossa dor. Pegaste numa pedra e lançaste-a, com uma força e uma raiva que eu não sabia existirem em ti. E, aos poucos, começaste a controlar a respiração e a limpar a cara molhada. Eu, talvez por não ter lançado nenhuma pedra aos patos, chorei mais um pouco. Mas por essa altura pensava em ti, que estavas ali a meu lado.
E percebi que não somos assim tão diferentes. Apenas usamos maneiras diferentes de lidarmos com os nossos problemas. Tu recorres ao isolamento total, ao álcool, aos medicamentos (já te disse que foi um disparate voltares a tomá-los). E eu tenho a droga, sempre a droga, e não consigo isolar-me como tu, porque aparentemente sou normal e não me deixam ficar em casa fechada durante semanas, mas lá o vou fazendo durante dias, quando posso.
Apeteceu-me dizer-te que és muito mais do que pensas ser. Que não és burro e que se não fosses tu, eu nunca teria sido inteligente como fui (eu acho que ainda sou, mas tenho a certeza de que era, portanto ficamos assim), porque sempre te tive como modelo. Sempre te tentei imitar, sempre tentei competir contigo, sempre tentei estar à tua altura. E era por isso que aos três anos já sabia coisas que só aos seis se aprendiam. Tu aprendias e ensinavas-me, logo de seguida, mesmo que por vezes nem te apercebesses. Tu sabias ler, eu tinha que aprender a ler. Tu jogavas mil e um desportos, eu tinha que aprender a ser boa nalgum. Tu sabias de cor as capitais de todos os países do mundo, eu tive que decorar a lista do PIB e do IDH. Eu fazia isto de forma inconsciente, não era que quisesse ser melhor que tu. Eu só queria ser como tu, para que nos dessem a mesma atenção.

- Putain, mais quel travail que papa et maman ont fait... - suspiraste ao fim de um tempo, esboçando o sorriso mais triste que eu já te vi na face.

Não te disse na altura, porque não me apetecia falar, mas eles não têm culpa. São culpados, sem dúvida. Mas nunca se aperceberam disso e, por isso, para mim, não têm qualquer culpa. Se duas crianças têm duas bonecas e uma das bonecas vai com elas para todo o lado dentro do carrinho e a outra fica completamente esquecida num canto, duvido que alguma delas venha, algum dia, a ser uma boneca feliz. Aposto que o sonho da que estava sempre a passear no carrinho era sentar-se, de vez em quando, na prateleira com as outras bonecas. E da outra boneca, acho que nem precisamos de falar. Mas o que importa é que as crianças não deixaram aquela boneca num canto de propósito. Aliás, não a deixaram num canto. Achavam que ela se ia dar bem com as outras bonecas e que não ia precisar de tanta atenção como a outra boneca, que levavam no carrinho. E afinal, sempre foi isso que a boneca abandonada deixou transparecer, sorria-lhes sempre que as via. Como podiam duas crianças perceber que a boneca era infeliz se ela lhes sorria sempre?

- Emmene-moi à la gare, s'il te plaît. J'ai peur d'y aller tout seul.

Com uma mão puxaste-me para cima. Entrelacei o meu braço no teu e acompanhei-te, como me pediste, pensando em como deve ser horrível deixar de se sair à rua por não se conseguir andar cem metros sem se ter uma tontura, uma náusea, um ataque de pânico. Quando foi que ficaste pior, outra vez? E porque é que eu nunca me apercebo? Eu sei a resposta, só não queria que fosse esta. Estou sempre tão absorvida na minha dor, que até hoje nunca me tinha lembrado que a tua existia. Desculpa. Atacou-me uma culpa, de tal maneira, que pensei em algo para te dizer. Mas falar nunca foi o meu forte, limitei-me a apertar com mais força o teu braço, com o meu.
E minutos depois, vi-te partir, no comboio, para casa. Lembrei-me de quando partilhávamos a mesma casa, aqui nesta cidade, em pequenos. Não chorei não por não ter vontade, mas porque tinha chorado tanto contigo à beira do lago que já não tinha lágrimas para chorar.

Promete-me que vais ser feliz. Promete-me que vais conseguir. Promete-me. Promets-moi, s'il te plaît. S'il te plaît, je t'empris. Se tu conseguires, eu também consigo. Por isso promete-me que vais ser feliz.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Batem as portas

Esta noite ergueu-se diante de mim um palco. Fui estrela de uma peça sem nome, para uma plateia sem gente. Nem diálogos, nem monólogos: lágrimas, só.
Apesar de não ter nome, teve tempo esta peça. Foram horas em que a dor falou, num choro silencioso que nem o chão, molhado de lágrimas, escutou. Agora que chega ao fim a peça, deveria cessar o choro. Deveria cessar a dor. Deveriam cessar as horas.
Mas todos continuam o seu caminho e eu, de entre tais candidatos, não me permitirei sair vencida, nesta luta que é a vida. Prossigo na noite que nada tem para me oferecer se não silêncio.
E no entanto, "batem as portas em tons de suicídio como se fossem um corpo a cair do nono andar".

Amanhã saberei que foi apenas mais uma noite em que morri.

Genève,
07.12.2008

Numa tarde de Domingo sem sol, vagueio pelas ruas quase desertas num passo apressado tentando diminuir o atraso com que vou chegar ao local combinado. O sítio nem sempre é o mesmo, mas para mim só o nome parece mudar, porque mal passo por entre as portas e vos vislumbro, numa mesa encostada à janela, associo o sítio a vocês.
Porque gostam vocês tanto destes cafés e patisseries enormes, capazes de receber dezenas senão centenas de pessoas em simultâneo? Paredes altas, muita luz, um ruído ensurdecedor que provém de um cruzamento de conversas e saudações, o tilintar de chávenas e colheres e o choro de crianças pequenas implorando por caprichos indiferentes aos pais que soltam gargalhadas e discutem entre amigos. Mal entro, apetece-me sair. Não o faço, claro. Visto mais uma máscara, pinto-me um sorriso polido e simpático e sento-me.
De início, não digo nada, após as saudações habituais. Espero que me façam perguntas às quais respondo sem qualquer interesse. O empregado surge, como se estivesse atento à minha chegada e peço o costume, café e copo de água. Precipitas-te a perguntar-me, mãe, se não quero comer nada. Perante o olhar fixo e a posição estática do empregado, respondo para ele que será apenas o café e o copo de água. Vira costas e desaparece.
Perguntam-me pelos meus dias. Sorrio para ter tempo de formular uma resposta, mas acabo por responder-vos aquilo que esperam. Falo-vos da creche, dos casos de gastroenterite com que lá me deparei esta semana. Menciono o exame de francês que fiz na semana passada, estou confiante em relação ao resultado. E mais, não tenho a dizer.
O assunto que gira à volta da mesa é agora a crise. Não participo da discussão, gostava de falar-vos da minha crise, das minhas febres nocturnas, mas sei que não é assunto chamado para esta mesa.
O meu pedido chega. Agradeço e observo a chávena e o copo em cima da mesa. E é precisamente neste momento em que os observo que me sinto, eu, observada também. Endireito-me na cadeira, que mais parece uma poltrona e cruzo o meu olhar com o teu.
Chamas-te Gabriela, tens nove anos e os teus pais são estes senhores que discutem com os meus, temas desinteressantes à nossa mesa. É tudo o que sei sobre ti. Mas sorrio-te. Retribuis e voltas a pegar no jogo electrónico que pousaras em cima dos joelhos. Bebo o meu café, morno, de um só trago. E, de seguida, alguma água.
O volume das vozes da mesa do lado desperta a minha atenção. Tento perceber de que agitação se trata, fico com a sensação de que é apenas um encontro de pessoas que há muito não se viam. Também a minha vida, desde sempre, tem sido marcada por esses encontros, mas eu prefiro o silêncio em tais ocasiões.
Volto para a minha mesa sem que dela tenha saído. Pelo menos ninguém deu pela minha ausência. Talvez me engane. Outra vez, Gabriela. Porque me olhas? Que esperas de mim? Será que tentas despir-me esta máscara e perceber do que é que sou feita por dentro? Deixa-te desse esforço inglório, minha querida, há muito que ninguém o consegue, há muito que nem eu sei do que sou feita por detrás daquilo que me visto.
Contemplas-me como se me quisesses conhecer. Também eu já tive nove anos, sabes? Também eu já estive sentada desse lado. E como eu admirava as mulheres adultas! Sonhava ser como elas, ter a beleza e o poder que me fascinavam, transformar a minha vida até então inútil naquele raio de espanto que elas pareciam provocar nos outros.
Não te iludas, Gabriela. Não há nada em mim que mereça a tua admiração. Durante anos, esperei como tu, desse lado, até que me dessem ordem para participar nas conversas de uma tarde de Domingo sem sol. Agora limito-me a presenciá-las, como sempre fiz, não porque as minhas ideias sejam consideradas inferiores, mas simplesmente porque são ideias desinteressantes, essas que correm pelas mesas dos cafés a abarrotar de gente desinteressante.
Levanto-me e digo que vou dar um passeio, aproveitar para espreitar a exposição que foi ontem inaugurada numa das pontes do lago. Para minha surpresa, levantas-te também e diriges-te à tua mãe. Sempre a mãe. Perguntas-lhe se podes ir comigo. Perante o olhar que ela me lança, digo que não tenciono demorar-me e que dentro de uma hora estaremos aqui.
Não restam agora dúvidas, Gabriela. Queres conhecer-me. Ou então esperas apenas escapar ao tédio de mais uma tarde em que a tua presença não se faz notar por entre os adultos.
Percorremos silenciosamente o caminho até à ponte. Quando lá chegamos, estacamos diante do primeiro quadro que nos aparece. Observo a pintura e só uma palavra me ocorre para descrevê-la: luz. Muita luz. Demoramo-nos cerca de meia hora a apreciar o resto da exposição. No percurso de volta ao café, trocamos ideias sobre as obras de que mais gostámos.
Acendo um cigarro e observas-me com ar de desilusão. Dizes-me que gostavas que a tua mãe não fumasse e que eu não fumasse e que ninguém mais no mundo fumasse. Acrescentas que o avô da tua melhor amiga morreu de cancro do pulmão porque fumava muito. Também o meu avô, Gabriela, também o meu avô morreu de cancro do pulmão e nunca um cigarro pôs à boca.
Passam por nós uns indivíduos de bicicleta e exclamas que é das coisas que mais gostas de fazer, andar de bicicleta. Sorrio. Pergunto-te se conheces Carouge, já ouviste falar e sabes que a tua mãe foi lá operada uma vez, mas nunca lá foste.
Um dia vamos lá as duas, então. Costumo ir lá muitas vezes, de bicicleta. Passeio-me pelas ruas quase sem carros, num pedalar suave e finjo ser de lá para que as pessoas me cumprimentem quando passo por elas. É tudo tão calmo e bonito, em Carouge. Confesso que é a minha parte preferida da cidade. As casas parecem tiradas de um filme de animação e não há nada mais natural do que nos sentirmos crianças, perto delas. É como que um refúgio desta cidade em que a manhã tem a mesma cor do entardecer - tudo é cinzento.
Chegamos ao café e dirigimo-nos à mesa em que estávamos sentadas há uma hora atrás. Desta vez não me sento. Tu respondes às perguntas que fazem sobre a exposição e o nosso passeio, e eu espero que me olhem, para anunciar-vos que me vou embora. Insistes para que eu fique, mãe, mas nem tu deves perceber o motivo dessa tua insistência - a minha presença aqui é inútil, tanto para mim como para ti.
Desejo um bom fim de tarde a todos e saio. Ao passar pela janela enconstada à vossa mesa, lanço um olhar para dentro. Não me olhes assim, Gabriela. Não podemos ser amigas. O que o mundo é para ti, já deixou de o ser para mim há muito. E longe de mim, Gabriela, falar-te da minha realidade e destruir-te esses teus sonhos que eu quase consigo ver, quando me olhas assim.
Não te preocupes, não me esquecerei de Carouge, do passeio de bicicleta. Não podemos ser amigas, mas talvez possamos fazer-nos companhia noutras tardes de Domingo sem sol.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

sim, ainda.

Há tanto tempo que não sonhava contigo, meu deus. E, tal como de todas as outras vezes, perdidas no tempo, o despertar do sonho foi tão doloroso, como se de uma queda do cimo de um arranha-céus se tratasse. O suor misturado com o batimento descontrolado do coração levaram-me a saltar da cama, ainda que algumas imagens irreais continuassem a percorrer-me o cérebro, quase que obrigando a que o pobre coitado voltasse a adormecer e prosseguisse com a tarefa em que se encontrava segundos antes.
Água. Demasiado quente. Fiz com que a torneira se movesse para o lado da meia-lua azul e observei o fio transparente correr por uns momentos, esperando que arrefecesse. Clique. Flash no cérebrozinho. Água. Também havia água no sonho, mas não me consigo recordar em que situação. Seria o mar? A chuva? Não consigo mesmo lembrar-me. Paciência. Eu sei que por mais que tente, é impossível reconstruir um sonho. Ficam os flashes.
Voltei a deitar-me. Por que raio é que eu tinha que voltar a sonhar contigo, passado tanto tempo desde a última vez? Eu pensava que não existiriam mais vezes, depois daquela. Afinal enganei-me.
Onde andarás tu, a estas horas?
Levei a mão ao telemóvel depois deste pensamento, só porque não sabia que horas eram. Cedo, se adormecer agora ainda durmo três horas. Mas fecho os olhos e apareces-me à frente, não dá para dormir assim.
Sabes, fico contente por te ver esta noite. Tenho uma lista infindável de pessoas com quem gostaria de estar agora, não te sintas demasiado importante. A solidão faz destas coisas. Mas é bom ter uma companhia que não tenha que entrar em mim e sair em forma de fumo espesso para se fazer sentir. Tu estás bem aqui, hoje. Vou contar-te como estou, mesmo que saiba que te continuas a esconder de mim e não queiras saber. Pelo menos hoje, apareceste.
De há umas semanas para cá não há sol. Imaginas como é viver sem sol? Não. Ninguém consegue imaginar isso. Eu própria, antes, achava que sabia o que era ter que viver assim, mas finalmente percebi que nunca soube. Até agora. Mas talvez para compensar o facto de não haver sol e de o amarelo e vermelho das folhas ter desaparecido (aliás, quem desapareceu foram as folhas), nevou. Foi sol (para mim) de pouca dura, mas soube-me muito bem. Eu sei que tu não és grande fã de neve, não quero estar a perder tempo com assuntos que te passam ao lado. Mas sinto que não tenho nada para contar sobre mim. Se bem que eu saiba que também sou um assunto que te passa ao lado. Mas estás aqui hoje.
Ai, meu amor. Se eu conseguisse explicar o que aqui vai dentro. Se eu te enumerasse todas as vezes que te tentei enterrar e perder de vista o sítio para não mais voltar a procurar-te. Nem quando fugiste, me senti assim, como me sinto agora. Naquela altura, achava-me a pessoa mais triste do mundo. Não tinha ninguém, é certo. Mas tinha esperança de um amanhã positivo, porque as memórias eram de ontem. Agora... Agora as memórias dispersaram-se. Já não sei o que se passou entre nós e o que se passou na minha cabeça e sei que o nunca mais que pronunciaste ou escreveste ou deixaste transparecer, vai acompanhar-me o resto da vida. Pouco importa. Não é de ti que sinto falta. Tu apareces-me porque não há mais ninguém. E porque as memórias... As memórias dispersaram-se mas voltam à tona de vez em quando.
Desde que me conheceste até ao tal nunca mais que não me lembro exactamente como é que saiu de ti, quis ser médica. Antes disso também. Lembras-te? Claro que te lembras. Tu também querias. E queres. Mas eu descobri que afinal não é isso que quero. Porquê? Quero ser feliz. E profissionalmente, uma pessoa pode ser bem-sucedida e respeitada. Mas nunca pode ser feliz.
Estava agora a olhar para ti e a tentar lembrar-me da última vez que partilhámos um momento feliz. Impossível. É como tentar reconstruir o sonho, não vale a pena. Mas talvez seja melhor assim, não achas? Eu sei que tu também não te lembras. Mas às vezes gostava de poder entrar nessa cabecinha e decobrir do que é que ainda te lembras. Eu lembro-me tão bem de tanta coisa. Eram dias de sol (mesmo que chovesse) em que os nossos corpos encaixavam tão bem sem qualquer esforço e em que eu consumia cada bocadinho do teu sorriso. Era assim que eu alimentava o meu. Eram horas que não se faziam notar, que passavam por nós entre beijos que nos ensinámos e que nunca mais foram os mesmos, por cabelos desalinhados de cores desiguais. A minha mão não era (e continua a não ser) suficientemente grande para ser da dimensão da tua. Mas o espacinho... O espacinho. E era muito mais. Eram ausências que não se faziam sentir pela certeza de te ter na minha vida. Que certeza mais incerta, meu amor. Agora sei disso. E agora, gostava que soubesses, que se pudesse pedir algo, não pedia beijos nem sorrisos, nem cabelos desalinhados, nem corpos despidos (de tudo, menos amor). Só peço alguém, meu amor. Alguém que me ouça. Alguém que apareça para eu poder contar o que se passa comigo, mesmo que não se passe nada de especial e que o primeiro assunto que me venha à mente seja a neve ou o sol. Meu amor, não preciso de ti. Preciso de alguém. E, para mim, hoje faz todo o sentido que esse alguém sejas tu. Porque resolveste aparecer, num sonho que já se perde na distância de horas. E eu mantive-te comigo, porque custa estar só. Não por te amar ou por te querer ter aqui.
Mas ainda és parte de mim. E enquanto me apareceres a meio da noite e me fizeres suar e elevar os batimentos do coração para o dobro, serás sempre parte de mim, meu amor. Mesmo que eu não queira. Desculpa. E obrigada, por hoje.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Genève
03.11.2008

- Foi num ápice. O cigarro estava aceso e, sem dar por isso, já estava caído no chão, sem chama, sem luz.
- Do que estás a falar?
- Foi o tempo que o sol demorou a desaparecer.
- Mas o sol nem apareceu hoje.
- Pois não.
- O céu esteve carregado de nuvens cinzentas durante todo o dia.
- Não. Enquanto o cigarro ardeu e os meus olhos estiveram postos no céu, posso assegurar-te que não foi cinzento que eles viram.
- Então?
- Os meus olhos viram laranja. E rosa. E depois cinzento arroxeado. E cinzento outra vez, mas ainda mais escuro. E finalmente, preto.
- Eu podia jurar que hoje o céu esteve sempre cinzento.
- Não esteve. Tu é que não reparaste e provavelmente ninguém reparou. Afinal, foi só o tempo de um cigarro arder. Provavelmente estavas enfiado no autocarro ou a tomar banho. E nem deste por isso. Eu escolhi a hora exacta para ir à janela fumar o meu cigarro.
- Eu continuo a achar que hoje o sol não apareceu e que o céu esteve sempre cinzento. Choveu, durante horas!
- Tens razão, o sol não apareceu. Mas o céu não esteve sempre cinzento.
- E o que é que isso interessa, também?
- Para quem não viu as cores que eu vi no céu hoje, não deve interessar nada. Assim como para mim não interessa nada o facto de ter chovido hoje, porque os estores estiveram fechados enquanto choveu. E tal como tu nem deste pelos tons de que o céu se vestiu há pouco, eu também nem reparei que choveu hoje.
- Pensava que só as pessoas que não tinham mais nada sobre que falar é que iam buscar o tempo como assunto.
- Mas eu não estou a falar sobre o tempo.
- Ah desculpa, pareceu. Posso acender? Estou à espera deste momento desde que acordei. É a primeira do dia!
- Podes, claro. Embora eu não esteja à espera de nada. Olha lá para fora. O céu está preto, agora. E quando o céu está preto, não vale a pena desejar qualquer outra cor, porque o preto não o permite. Mas quando o céu está cinzento... Quando o céu está cinzento podemos sempre esperar que ele permaneça cinzento ou podemos fechar os estores e esquecer que ele está cinzento. E continuar a nossa vida sem pensar na cor do céu. E quem sabe, se quando abrirmos os estores não estará um momento bonito à nossa espera.
- Eu gosto de dias cinzentos. Acho a chuva bonita. E não há nada mais especial do que aquele reflexo que às vezes se forma no chão, nas poças de água. Parece um arco-íris debaixo dos nossos pés.
- Vês, eu não estava a falar do tempo. Eu estava a falar de beleza. Hoje foi um dia cinzento. E eu, ao contrário de ti, odeio dias cinzentos. No entanto, posso afirmar, que desde que aqui cheguei, este foi o dia mais bonito que já vivi. E até há umas horas atrás estava longe de achar isso.
- Acho que depois de experimentares isto o teu dia ainda vai ficar mais bonito, toma.
- Não, agora o céu está preto. Não há nada a fazer. E eu já tive o meu momento bonito de hoje. Tenho a certeza de que ontem também tive esse momento mas nem reparei nele. E aposto que tem sido assim todos os dias, eu é que sou burra.
- Então o que é que vais fazer? Vais desejar que o momento em que fores à janela amanhã, seja outra vez o momento bonito do dia? E se não for?
- Não. Amanhã certamente que nem sequer irei à janela. Vou desejar que amanhã, quando eu acordar, o céu esteja cinzento. Quero sentir-me bem em relação a isso. Quero sentir que está um dia cinzento e bonito. Quero ir à rua e sentir que o frio que anunciaram na meteorologia é indiferente. Quero sentir que por mais cinzento que esteja o meu dia, quando eu menos esperar (não interessa se vou estar a fumar o meu cigarro ou se vou estar enfiada no autocarro) o rosa, o laranja e o cinzento arroxeado vão aparecer. E chamar-lhes estes nomes é ridículo. Mas é a única forma de tentar traduzir por palavras um sentimento de beleza. E mesmo assim, parece que não percebeste nada do que acabei de dizer.
- Vamos dizer que é o efeito disso que tens na mão que não me permite perceber.
- Sim. Afinal, isto serve sempre como desculpa para tudo, não é? Para tudo talvez não, mas por exemplo para não percebermos os que os outros nos dizem ou simplesmente para nos contentarmos com cinzento quando no fim de contas há rosa, laranja e cinzento arroxeado... (Pausa) Põe lá o filme.
- Boa ideia!

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Génial, Edith.

Je ne veux pas travailler
Je ne veux pas déjeuner
Je veux seulement oublier
Et puis, je fume!

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

la groupie du pianiste

O meu desejo é somente deixar de ser piano, para poder ser pianista, uma vez na vida. Doem-me as teclas, que tu quase partiste. E como não me contento em ser apenas a amante do pianista, porque isso ao lado de ser o piano, não é nada, acho que vou esperar que quebres com violência todo o meu teclado, para poder, finalmente, sentar-me diante de outro piano qualquer e estimá-lo como tu deverias ter-me estimado. Até lá, andarei por aí, que nem um piano desafinado, velho e sujo, cheio de recordações por debaixo da cauda pesada.

"Elle fout toute sa vie en l'air
Et toute sa vie c'est pas grand chose
Qu'est-ce qu'elle aurait bien pu faire
A part rêver seule dans son lit
Le soir entre ses draps roses

Elle passe sa vie à l'attendre
Pour un mot, pour un geste tendre
La groupie du pianiste

Devant l'hôtel dans les coulisses
Elle rêve de la vie d'artiste
La groupie du pianiste

Elle le suivrait jusqu'en enfer
Et même l'enfer c'est pas grand chose
À côté d'être seule sur terre
Et elle y pense dans son lit
Le soir entre ses draps roses

Elle l'aime, elle l'adore
Plus que tout elle l'aime
C'est beau comme elle l'aime
Elle l'aime, elle l'adore
C'est fou comme elle l'aime
C'est beau comme elle l'aime

(...) "

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

pensons à l'avenir, bébé!

Caminhar por ruas desconhecidas e sentir-me livre. Tão livre. Para ser quem quiser, para agir como me apetecer, para deixar de me limitar a pensar de acordo com o que sinto, sem demonstrá-lo a quem me rodeia. Porque quem me rodeia não faz ideia, mas tem direito de não fazer ideia. Finalmente, estranhos. Novas caras, a cada minuto que passa. Não corre brisa, abafa-nos o ar parado e quente sem deixar arrefecer o que portamos cá dentro. Sento-me num banco de jardim e observo a água do lago, que não sei bem descortinar de que cor é. Talvez bem azul, talvez um pouco esverdeada, como tu tanto gostavas. Apetece-me mergulhar. Não nesta água, mas na tua ausência que não se sente como outrora. Faz sentido esta vida sem ti. Fazem sentido as horas passadas no meu sofá laranja onde nunca estiveste. Nem me custa fazer o mesmo caminho todos os dias, porque nunca o fizeste comigo. É até agradável caminhar por aqui e não há sítio que me traga más memórias nesta cidade. Por vezes perco-me. Não nas ruas desconhecidas, mas nos meus pensamentos, porque não há necessidade de parar, eles não destroem como fizeram durante tanto tempo. São, aliás, a base para construir tudo o que está para vir. E o que está para vir não pode certamente ser pior do que tudo aquilo que passou.
E é bom conhecer gente de todo o mundo, sentir-me uma cidadã do mundo. Quase que sinto vontade de comprar um dossier e arranjar um projecto novo. Quase que sinto vontade de dizer não ao teu amor e ao de quem quer que seja que apareça para me amar a mim mesma. Quase que sinto vontade de deixar de te ter cá dentro para poder ocupar este espaço com outros sentimentos que não este tão carregado de mágoa e de tristeza. Eles não sabem como é bom mudar de vida. Eles desconhecem por completo o amor e as loucuras que ele nos faz cometer. Eles acham que é fácil, que não há razões que justifiquem os nossos actos, mas nós conhecemo-las todas e queríamos tanto que nunca tivessem existido.
Não vou ficar por aqui muito tempo. Tenho cinco continentes por explorar, biliões de pessoas para conhecer, milhares de dias novos com ou sem sol à minha espera. E todas as noites, quando me deitar, vai ser em ti que vou pensar. Mas sei que vou sorrir porque não és tu quem me vai fazer falta. Não será mais o passado que me fará falta. Será o dia seguinte. Porque vou querer mais e mais, mesmo sem saber até onde poderá ir o mais. Não vou fazer grandes planos, não me vou agarrar a nada, nem a pessoas nem a lugares, porque ficar de novo presa, só se for a um caixão. Nem isso, as minhas cinzas hão de ser espalhadas em diversos lugares para que eu não sinta o sufoco de um só local a entrar-me pelo corpo. Porque a alma, estará bem longe. Fora daqui, fora de ti, fora do que fui. Mas repleta de vivências que ainda agora começaram a florescer-me na pele.
E se eles soubessem como é bom poder, finalmente, aprender por mim própria, sem dar por mim fechada num cubículo com mais vinte pessoas que pensam que o que lhes é dito é verdadeiro. Sem ter que ouvir alguém disparar informação que alguém inventou para que outros a absorvessem. O que os outros viveram e descobriram é parte deles, nunca percebi porque é que faziam tanta questão que fizesse parte de mim também. Agora posso escolher o que quero que faça parte de mim. E tu, não constas na lista de opções. Tu, serás apenas um telefonema no primeiro dia de Outubro, umas palavras num papel quando o coração assim o ditar. Mas jamais serás o futuro. E tudo o que importa agora, é isso mesmo. O futuro sem ti.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

l'horloge fleurie

Como a vida é irónica! Durante meses deixei-me invadir pela angústia de um tic-tac apressado que certamente ditaria o fim de alguma coisa. Mas nunca pensei que quando o ponteiro acabasse de dar a sua volta, não se ouvisse mais tic-tac algum. Agora passeio por ruas que de uma ponta à outra são ocupadas por montras com relógios, enfio-me num Jardin Anglais que tem um relógio feito de flores, deparo-me com cartazes coloridos por letras grossas que compõem a expressão "Cité du Temps", as pessoas correm todas para um qualquer lugar arregaçando a camisa para darem uma olhadela no pequeno objecto que lhes veste o pulso. E eu, não ouço tic-tac nenhum. Não trago no pulso relógio algum. A agenda, está por estrear. Não importa se o mês que se segue é Outubro ou Novembro, nem quanto tempo falta para o Natal. Não corro para lado algum, não tenho quem me espere numa qualquer ponta desta cidade, nem te tenho comigo a dar pelo tempo passar, ouvindo um tic-tac que desta vez não seria angustiante, mas antes um tic-tac esperançoso, ansioso por um reencontro. Pouco importam os reencontros, agora. E de cada vez que um tic-tac acaba, nasce um novo para alguém. Aposto que a esta hora já sentes o ponteiro avançar. Comigo nunca é assim, há tic-tacs que se eu pudesse, faria com que durassem uma vida, mas como ninguém controla o tempo (ele nem existe!) vejo apenas o ponteiro ficar parado no sítio em que ele escolheu deixar de tic-tacar.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

esboços

A minha mãe costumava dizer-me que eu passava mais tempo no quarto agarrada aos meus dossiers e ao meu computador, do que o tempo que passava a fazer tudo o resto. E por tudo o resto, entende-se comer, dormir, ir à escola, porque estar em família, apesar dos esforços que ela fazia, não era actividade com que eu quisesse ocupar o meu tempo precioso. E todas as actividades para as quais ela me incentivou a entrar, abandonei ao fim de uns meses por achar que estava melhor em casa, com o meu próprio programa que era compatível com os meus interesses e vontades.
O que ela não sabia, ou se sabia, não entendia, era o porquê de tantas horas passadas enfiada no quarto, a preencher páginas ou documentos de texto, que eu escondia e minimizava, respectivamente, sempre que ela entrava na divisão que era só minha e da qual eu não percebia porque é que não podia usufruir sem ser incomodada.
Hoje, alguns anos depois, questiono-me sobre o facto de ter escondido sempre os meus dossiers repletos de ideias que eram sonhos que partiam de uma criança, que aos poucos foi crescendo e afastando cada vez mais da origem, esforçando-se por não continuar a ser um prolongamento dos pais que em nada eram parecidos consigo. A resposta não é difícil, afinal.

Mãe, eu escondia-te tudo aquilo que era meu, porque sabia que tu não eras como eu e o que era meu, não poderia nunca ser teu. Não por eu querer que assim fosse, mas por tu não quereres abraçar aquilo que era meu, que partia de mim.
Um dia vou falar-te sobre tudo, embora me custe falar sobre tudo, porque aquilo que era tudo na altura dos dossiers e do computador velho e branco e barulhento, hoje resume-se a um livrinho de memórias que eu deixei que permanecesse dentro de mim, por não ter coragem de mandá-lo fora como fiz com os dossiers e o computador velho.
Mas se queres saber, cada dossier correspondia a um sonho. E hoje vou falar-te apenas de um.
Num dos dossiers, cuja capa eram riscas azuis escuras que contrastavam com riscas azuis claras, as claras mais finas que as escuras, encontravam-se dezenas de páginas brancas, cada uma com um esboço. Esboço de quê, perguntas tu, ao que eu respondo, esboço da minha casa ideal. Como te disse, as folhas eram muitas, cada uma com um esboço. E descobri, ao fim de algum tempo, quando dei o dossier por concluído, que nunca iria conseguir desenhar a casa ideal. E se até à altura queria ser arquitecta, essa profissão foi imediatamente posta de parte, o dossier arrumado num armário com que eu não tivesse que me deparar todos os dias, os catálogos do ikea que recebíamos em casa atirados para o ecoponto azul e as muitas horas passadas em torno de folhas brancas com um lápis de carvão na mão, transformaram-se para mim numa situação ridícula que, daquele momento em diante, só poderia fazer parte do passado.
Mas porque é que não conseguiste desenhar a casa ideal, perguntas tu, novamente. Porque todas as casas me pareciam ideais. De cada vez que eu pegava no lápis e me saía um traço, o meu interior quase que rebentava, invadido por uma insustentável vontade de ser feliz e de conseguir, em cada traço dos meus desenhos, transmitir a felicidade que a casa em que se poderia transformar aquele esboço, me iria proporcionar. Então, cada folha tinha um qualquer pormenor que, juntamente com todos os outros, poderia não encaixar na perfeição, mas era essencial na sua individualidade como pertencente a um todo imaginário. Não estou a perceber o que queres dizer com isso, reclamas, abanando a cabeça. Não precisas de perceber nada disso, mãe. Para mim só é importante que percebas, que em tempos, desenhar quatro traços e dispor, consoante o meu gosto, os móveis e objectos de uma sala num papel, foi algo que me preencheu. Que passei horas e horas durante anos a pesquisar sobre quais os materiais mais apropriados, a decoração mais adequada e o espaço necessário, porque isso me aconchegava. Que investia todo o meu tempo no projecto da minha casa ideal porque isso me fazia esquecer o vazio que eu sentia existir em mim devido à distância que sempre esteve entre nós enquanto família.
Sabes, na minha casa ideal o sofá da sala era vermelho. Quando há uns meses saímos da cidade e fomos as duas escolher o sofá, naquele dia frio de sol, tu sugeriste um bege e o laranja, que acabámos por escolher. Que tu acabaste por escolher. Naquele momento era-me completamente indiferente a cor, a forma ou o tamanho do sofá. Era desnecessário até, haver um sofá.
Hoje percebo, mãe, porque é que tinha tanta vergonha e tanto medo de te mostrar o meu dossier às riscas azuis claras e escuras. Idealizar é ridículo, tinhas razão quando falavas em perda de tempo. Hoje sei que o meu maior erro foi ter perdido tanto tempo com esboços, quando o esboço da vida, já é a própria vida.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Um dia achei que tudo
Iria ser perfeito.
Bastava sorrir
E logo as pessoas sorriam
Também, por acharem
Que o sorriso de uma criança,
Seria capaz de mover
Este e outros mundos.

Um dia soube que seria assim.
O sorriso de criança,
Não poderia simplesmente
Ser eterno
E contagiar em volta
As pessoas que mostraram
Ser efémeras.

E o mundo caiu.
E sem sorrir, criança sempre,
Deixei-me cair também.
Por ser fácil cair
Ao reparar, que
O mundo que antes movia,
Era feito de sorrisos
Entristecidos.

05.07.2008

quinta-feira, 3 de julho de 2008

quase passado

"Foi mais um sol que nasceu mais uma vez igual
Mais uma vez contigo esquecemos o mal
Que nos fazemos aos dois por deixar para depois o que fizemos real.

Mais uma vez um abraço, aquele abraço de sempre
Aquele abraço que sente o que para sempre é segredo
Impaciente segredo e suave presença perdida em nós, despida em nós.

Ainda me fazes pensar, quase achar, que te amo
Quase achar que o destino se enganou no caminho
Esperar que me toques é vício que adoro e que me faz pensar.

Só não te quero ver chorar por ti.
Só não te quero ver a olhar para trás, para nós."

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Who needs enemies?

Num instante apenas, o sorriso de orelha-a-orelha, o olhar profundo, a textura aveludada da pele e a brisa suave da respiração desaparecem para dar lugar a um monstro de dimensões enormes, pronto a atacar. Tudo o que não se sabia, sabe-se agora. Segredos que permaneceram tranquilos no interior de alguém deambulam agora à superfície do oceano até chegarem a mim, permitindo-me conhecer um pouco mais do pescador que os guardou. E é então que tudo o que eu não entendia antes, começa a fazer todo o sentido. É só encaixar as peças do puzzle do terror que me foi destinado. Vezes sem conta.
Será que vale a pena continuar a acreditar na bondade dos outros? Por mais que eu tente fugir à realidade, tenho que aceitar a terrível verdade. As pessoas más existem. Porque é que eu insisto em mantê-las perto de mim, mesmo depois de todo o mal que me fazem? Talvez a solução passe por tirar umas férias desta gente.


sábado, 14 de junho de 2008

rechute II

Para onde terá ido? Não o encontro. Há-de estar algures por aqui, não acredito que tenhas conseguido tirar tudo de mim, até isso. Dou por mim a querer amar, mas não consigo. Para onde foi o meu amor? Para onde fugiram aqueles sentimentos que eu gostava tanto que morassem em mim?
Surgem novos sorrisos, novas mãos para apertar, novos corpos por explorar. E eu olho para eles e apetece-me abraçá-los a todos, tenho vontade de pertencer a alguém outra vez, de proporcionar felicidade através de um beijo. Mas depois nenhum deles é como tu, não há nada no calor dos novos corpos que me aqueça como tu o fazias. Sei que não te estou a substituir quando faço com alguém coisas que eram só nossas, mas é inevitável não pensar em ti quando o faço. É por isso que me farto tão rapidamente de viver momentos desses com alguém. E acabo por ter dias como o de hoje, em que nem dou pelo tempo passar, enfiada de pijama na cama, envolta por uma atmosfera vazia de afectos e de pessoas, achando que me vou sentir melhor assim. É pura ilusão. Não me sinto melhor, nem pior. Tenho comigo as lágrimas e a tristeza por saber que jamais entrarás neste quarto e te deitarás comigo, aquecendo-me o corpo, devolvendo-me o sorriso, transformando em magia cada um dos meus gestos. Tenho saudades de te desenhar nas costas com os dedos, desenhos imaginários, que tu procuravas descobrir o que significavam. Significavam amor. Tudo significava amor, entre nós. E se soubesses as mãos que já tentei encaixar na minha, para ver se entre elas iria nascer algo que me preenchesse tanto como o fazia o espacinho que ficava entre as nossas...
Já não tenho saudades da nossa vida, da nossa rotina. Agora tenho uma nova que me vai abstraíndo do passado e não penso em ti como antes. Nem seria capaz de trocar a minha nova rotina por ti, neste momento. Acho que sair desta rotina, só quando perceber que cheguei ao fundo e já não dá mais, como aconteceu connosco. Mas quando estou sozinha nesta cama, não encontro calma. O meu coração bate tanto, tal como de cada vez que eu te vejo. Ainda parece que quer saltar de cada vez que os meus olhos pousam em ti, não sabes como é mau sentir isto, como dói nem sequer um olhar ver retribuído. E é ridículo estar para aqui a escrever-te coisas que não tens qualquer interesse em ler, num lugar que desconheces, que nunca te quis mostrar por saber que não irias gostar de conhecer. Tenho a certeza de que não tens noção da gravidade, não imaginas que isto tem sido assim por estes lados, pensas que estou minimamente bem, embora de vez em quando não aguente mais e te mande uma mensagem, que é um grito que tu ouves e ignoras. Mas pensas que são momentos de fraqueza, aposto que também já os tiveste. Mas não são. São os picos, o clímax de uma vida que mata, momentos em que já nada faz sentido e eu ainda te procuro como se me pudesses oferecer algo que me deixasse bem. Nem um sorriso. Nem disso és capaz. E já foste capaz de tudo, já foste a vida e a morte para mim, já foste o que há entre e para além disso, já foste o amor, a dor, foste o motivo pelo qual sonhar fazia sentido. Foste tudo e aos poucos vais-te transformando em nada. Eu não quero ser realista, mas se o fosse, já teria percebido há muito tempo que não és nada na minha vida actual. Não há um abraço, não há uma conversa, não há a tua mão na minha. Não há. Não há manhãs nem noites partilhadas na mesma cama, cheiros que se fundem e bocas que se buscam, nem pontas de narizes que se tocam. Não há amor em nós. Não há amor em mim. Não há amor em mim.

domingo, 8 de junho de 2008

rechute

Gostava que tivessem lá estado hoje. Mãe, podias ter-me ajudado a escolher um vestido mais bonito do que aquele que levei e maquilhar-me-ias, tu sabes que eu não sou muita dotada para expôr a minha beleza exterior (como poderei atrever-me a dar a conhecer aos outros a interior, se nem esta que aparenta ser uma beleza fácil, eu gosto de mostrar?). E tu, pai, não aprecias nada festas deste género, mas aposto que farias um esforço para estares lá a sorrir e a ver-me subir aquele palco.
Hoje senti que já não vos tenho. O que estariam vocês a fazer àquela hora? Em que mesa estariam sentados a comer? Sinto que não sei nada de vocês e sei que há muito tempo que não sabem de mim também. Gostava que me conhecessem, que tivéssemos conversas infindáveis sobre livros ou drogas ou amor, tanto faz.
Os olhares daqueles pais deixavam transparecer tanto orgulho que, por momentos, senti inveja daquela gente toda, por não vos ter lá, por não ter ninguém orgulhoso de mim esta noite. Esta noite? Eu não vos dou qualquer motivo de orgulho há muito tempo, mas esforcei-me durante tantos anos por vos impressionar e deixar felizes, e sinto que nunca me souberam dar o devido valor, nunca foram capazes de dizer "filha, temos orgulho em ti, tu fazes-nos felizes". Se não me deram valor quando eu realmente vos dei razões para isso, sei que não é agora que não faço nada para vos ver felizes nem vos tento dar motivos para se orgulharem de mim, que vão achar em mim a filha que sempre sonharam ter.
"Era tão boa aluna...". Oh mãe, sou tão mais inteligente fora da escola agora. Já vivi tanto, já sofri tanto, e acabei de fazer dezoito anos. Gostava que pudesses entender que não escolhi o caminho de fazer tudo como me ensinaram, gostava que pudesses perceber que não gosto de fazer as coisas por fazer, porque me cansei de viver uma rotina que não me preenchia. Usei como recurso coisas que tu sempre achaste impensáveis para mim. Tens razão, se calhar optei pela escapatória mais fácil (e errada), mas não me condenes. O meu mundo é tão triste que eu tinha que inventar outro onde pudesse ter momentos de felicidade (será?) tão intensa que me fizessem esquecer a pessoa vazia que sou neste mundo de gente desinteressante, que já ouviu tanto de mim mas que no fundo, não sabe nada do que aqui vai dentro. Sei que isto não tem desculpa, que existiam outras formas de contornar a situação e que acabei por ir contra os meus próprios princípios, fazendo da minha vida aquilo que eu tinha a certeza de não querer para mim. Mas quando o grito não sai, a ajuda não vem. O grito vai aumentando a cada dia que passa e eu aprendi a contê-lo e a não precisar de exteriorizá-lo. Acabo por deitá-lo cá para fora, mas não se dirige a ninguém. É algo que fica no ar, tal e qual uma nuvem de fumo espessa que teima em invadir-me o espaço, mas que não invande o de mais ninguém.

Isto tudo para dizer que aos poucos deixo de sentir a vossa ausência, mas hoje tive uma recaída.

domingo, 25 de maio de 2008

oh lordy, trouble so hard.

Perdoa-me meu amor, preciso tanto do teu perdão para voltar a ser feliz.
Perdoa-me, perdoa-me. A tua indiferença é morte para mim.

Perdoa-me mãe, sinto tanto a tua falta.
Perdoa-me pai, por não me conheceres.
Perdoa-me mano, por nunca te ter percebido nem tentado ajudar.
Perdoa-me família, por já não teres qualquer importância na minha vida.
Perdoem-me os meus amigos, por não conseguir apoiá-los.
Perdoem-me todas as pessoas de quem me afastei, a solidão às vezes aconchega.
Perdoem-me todas as pessoas a quem fiz mal, nunca foi minha intenção.
Perdoa-me Deus, por não crer na tua existência.
Perdoa-me droga, por te dar tanto uso.
Perdoa-me escola, por não querer saber de ti.
Perdoa-me casa, por te ter transformado em algo que talvez preferisses não ser.
Perdoa-me tecto, por me perder tantas vezes a olhar para a ti.
Perdoem-me os lençóis e a almofada, por absorverem tantas das minhas lágrimas.
Perdoa-me mundo, por não me mover em tua função.
Perdoa-me sociedade, por empacotar as tuas regras e enviá-las para bem longe, nós não coexistimos.
Perdoa-me pássaro que voas lá fora, não tenho asas como tu.
Perdoa-me arco-íris, aqui já só mora o preto.
Perdoa-me solidão, por passar tanto tempo contigo.
Perdoa-me corpo, andar custa mas tem que ser.
Perdoa-me minha alma, deixaram-te tão vazia.
Perdoa-me vida, por estar a desistir de ti.


Não sei mais o que fazer.
Dizem que só o perdão nos pode salvar. No meu caso são tantos perdões que prefiro não acreditar que algum dia algo ou alguém me salve. Eu perdoo-vos a todos, mesmo que não vos consiga salvar de nada.


terça-feira, 20 de maio de 2008

i'm yours, forever.

Meu amor, gostava de estar ao pé de ti e conseguir dizer-te o quanto as tuas palavras me tocam, mas escrever é bem mais fácil. Em menos de uma semana deste-me aquela carta, que eu reli várias vezes em Amesterdão quando me senti sozinha e agora mais uma surpresa no teu blog.
Quero esquecer o tic-tac e pensar apenas que vamos aproveitar bem o pouco tempo que nos resta. Há dias em que acho que já nada me prende aqui e que não será assim tão mau partir. Mas depois, de cada vez que olho para ti, só me apetece ficar e partilhar contigo tudo, tudo, tudo. Tudo o que está para vir.

Não me condenes por me deixar consumir por coisas que me fazem mal.
Eu quero que saibas que se não te tivesse tido nestes últimos dois anos,
Talvez tivessem sido dois anos sem histórias minhas para contar.
Os meus segredos, acabariam por me matar,
Se não pudesse partilhar muitos deles contigo.
Sei que um dia,
Hei-de gritar-te os que faltam, um por um,
Sem medo.
Porque sei que me vou poder agarrar a ti e que entenderás tudo.
Tu és, meu amor,
Quem me faz acreditar que até no mundo mais triste há sempre alguém para nos salvar.
Afirmo, com toda a sinceridade
Que te amo e juro, juro por tudo, que nunca me fizeste mal.
Gosto da forma como me consomes
E conferes algum sentido à minha existência,
Tornando-a menos insuportável.
A mim basta-me um sorriso teu, S.
Há dias em que coisa alguma, para além dessa, me devolve o meu.

domingo, 18 de maio de 2008

thai

Amesterdão,
15 Maio 2008

O que se passa? O que é isto?
Shiu. Não podemos falar alto. Acabámos de entrar num mundo mágico, onde a qualquer momento pode surgir um ruído que os teus ouvidos vão achar apaixonante. Não fales, não te mexas muito. Abre a mente. Sente. Sente.

Será que passaram horas? Minutos? Não sei precisar. Para mim pode ter sido há muito tempo ou pode ter acabado de acontecer, as duas perspectivas adaptam-se. Não me sinto. Não sei quem sou neste momento, nem o que estou a fazer cercada neste cubículo de quatro paredes, com pessoas que decidiram entrar neste mundo novo comigo. Elas não estão comigo, mas eu observo-lhes atentamente os movimentos, na expectativa de tentar perceber o que estarão a sentir, se de certa forma, poderei partilhar com elas os meus pensamentos.
Mas afinal, no que estou eu a pensar? Ora é a pizza que tenho nas mãos, ora é o cigarro que está dentro do maço pousado na bancada da cozinha. O meu olhar salta do amigo que está lá fora enrolado num edredon para o amigo que está deitado na cama a contorcer-se. Será dor? Não, eu que em cada minuto da minha vida carrego uma dor insuportável, hoje, neste momento que não sei dizer onde se situa no tempo, consegui libertar-me dela. A dor não existe, tal como o tempo. O que é o tempo? Desde que abri esta porta e a fechei atrás de mim, todos os relógios desapareceram. Todos os momentos que se passam no mesmo instante se dividiram em vários e formaram sub-tempos. E nos sub-tempos ainda se formaram tempos imaginários e viagens no tempo. Não faz sentido falar em tempo. Já fui até à minha infância e sonhei com o meu futuro, pensei em pessoas que não estão e observei outras através da janela, espreitei o que se passava na sala enquanto trocava um olhar inocente com o amigo que está lá fora. Tudo agora. Cada momento prevalece, cada momento tem a sua continuidade e fica guardado comigo para entretanto voltar a ser evocado. Eu nem sei em que tempo hei-de escrever isto. O passado, o presente e o futuro só servem para nos baralhar, eu estou a viver o agora e este agora engloba os três e não engloba nenhum. É tudo tão surreal, mas tão verdadeiro. Eu olho para eles e vejo seres tão autênticos que gostava de saber o que lhes vai na mente. Será que também já perceberam que o tempo não existe? Estão fartos de se cruzar comigo e não dizem nada, começo a sentir-me sozinha. Tenho que me concentrar numa das muitas ideias que me vão na cabeça e deixá-los pensar nas suas. O sofá da sala está tão bonito, nunca vi cor tão bela na vida. Apetece-me ficar lá sentada para sempre e fundir-me naquele vermelho tão reluzente, sem pensar em tempo nem dor. Deixar-me ficar, livre de tudo o resto, de todos os ideais impostos por quem nunca me conheceu, da minha rotina desgastante e das pessoas que dela fazem parte, das minhas obrigações, da pessoa que sou diante dos outros no mundo real, de ti... Apetece-me gritar de tão livre que me sinto, mas não vou gritar. Não quero perder nenhum ruído bonito vindo lá de fora ou mesmo cá de dentro. Não sei descrevê-la, mas está constantemente uma música a tocar-me aos ouvidos e é tão agradável, tão relaxante, que me sinto flutuar. Não sei que sensação é esta, mas é como atingir um patamar acima na escala dos mundos surreais. Apetece-me ficar neste mundo para sempre, mas lembro-me agora de que afinal não fechei a porta atrás de mim. Só a deixei encostada e vou ter que voltar para o mundo onde as cores não têm piada, nem existem músicas de embalar. Onde os relógios ditam o que fazer e as pessoas não têm em volta da face uma auréola recheada deste encanto inocente.
Voltei a sentir-me criança. Cada pedaço deste mundo parece estar encantado, o meu olhar saltita de uma coisa para a outra porque tudo parece ser mágico. Toco nas coisas com cuidado para que nada se estrague e deixo-me enfeitiçar por elas. Quero conhecê-las todas, quero poder absorver tudo à minha volta e estou quase a consegui-lo. Sabes, não fazes falta por aqui hoje. Estou livre, até de ti. É tão bom não sentir o sangue correr nas veias nem o coração bater e saber-se que se está em ebulição no âmago. Sinto pequenas explosões darem lugar no meu interior mas a superfície deste vulcão, constitui um corpo que enfim descansa das máscaras que há tanto tempo suportava. Nudez que aconchega, esta. Estou livre, tão livre. Até das máscaras, estou despida de tudo aquilo que de mau foi incutido em mim.

Abri a mente e senti, finalmente, o que é libertar-me de tudo. Posso dormir, agora. Está na hora de transformar as utopias do meu consciente no brinquedo desta noite para o inconsciente.



segunda-feira, 5 de maio de 2008

3, 2, 1...

Três. Três meses para me ir embora, inicia-se a contagem decrescente.
Há duas semanas que não choro a tua ausência de dois anos, nem te mando nenhuma mensagem cuja resposta nunca obterei. E há precisamente sete dias estava em casa, em família. Hoje é Domingo e há umas horas estava sentada no último banco de um autocarro velho a pensar sobre a vida. Olha, amanhã por volta das 10h30 vou dançar valsa. Dentro de cinco dias serei maior de idade! Tenho precisamente um mês e meio para estudar matemática e tirar positiva no exame. A última vez que me apercebi de como é passar três dias sem droga já foi há mais de seis meses. Se tudo correr bem, no Verão terei a carta. Há quanto tempo não estás comigo? Exactamente 300 dias, mas ainda na Sexta te vi. Desde Agosto que não vejo a Anne, e a Véro morreu um mês antes. Há onze meses atrás ainda não vivia sozinha, há dois anos ainda tinha uma mãe que me acordava todas as manhãs e há treze um pai que via ao fim-de-semana.
São 15h27 de um Domingo sem sol. Onde estava eu a esta hora num Domingo de há dez anos? Casa dos avós provavelmente, a família toda reunida à excepção do pai. E há três anos? Contigo, na tua cama, talvez.
E hoje? Hoje será a mesma rotina de há meses: fumar, fumar, fumar, até não ter mais consciência de quem sou ou do que estou a fazer.

É isto que me vai na cabeça.
Quem é que se lembrou de inventar a merda do tempo e das datas e de tudo o que pressuponha uma contagem que nos conduz à demência de tanto pensarmos nela? É inevitável, parece que existe um registador automático dentro de mim, que de vez em quando soa um alarme para eu ir rever o que aconteceu na puta do dia em que troquei a família por ti ou no dia em que me trocaste por não sei bem o quê e eu substituí tudo e todos por um mundo que em vez de pessoas, tem substâncias químicas a tentarem ajudar.


quinta-feira, 10 de abril de 2008

Grito

E sob a forma desejada
A noite deita-se comigo
E é a tua ausência
Nua nos meus braços.

Experimento um grito
Contra o teu silêncio
Experimento um silêncio
Entro e saio
De mãos pálidas nos bolsos.

Pretextos para fugir do real
Alexandre O'neill


Não há sítio cá dentro que aguente mais conter este grito, mas também não há voz capaz de dar fim ao silêncio. Que fazer? Que dizer? Que esconder?

Gritar?
Calar o grito, de novo?

Escrever, escrever. Que o grito parece sair em surdina, mas pelo menos não mora cá mais.
Pudesse eu gritar a todos tudo o que está contido em mim, como o faço para a noite quando ela se deita comigo. Ela deve estar a chegar e quando chegar, não aquecerá a cama. Tornará ainda mais gélido o ar que me diz olá por de baixo dos lençóis. E eu gritar-lhe-ei para que me aqueça, apesar de saber que a sua única resposta será silêncio.

É por ter medo que me respondas da mesma forma que desisti de te gritar.


quarta-feira, 2 de abril de 2008

parfois, la solitude peut être rassurante.

Não é saudável. Nada tem sido saudável.